Oi pessoalzinho!
Hoje começa o nosso "pacote Dia das Mães". Serão três posts seguidos sobre o tema. Começamos hoje com a participação especial da psicóloga Valéria Meirelles, que nos conta sobre sua opção de não ter sido mãe.
Amanhã é dia de um artigo bem interessante sobre a forma como as pessoas questionam as mulheres sobre ter ou não filhos.
Por fim, no domingão, uma amiga da Bela que sempre sonhou ter filhos conta como está sendo seu primeiríssimo dia das mães!
Boa leitura!
beijos do Trio
Ontem conheci por telefone a jornalista Débora, com quem conversei sobre minha paixão profissional atual: Psicologia do Dinheiro. Depois de quase uma hora, falando sobre educação financeira de crianças, ela me perguntou se eu tinha filhos. Respondi que não e pairou no ar em clima de reticências. Calejada que sou no assunto, disse que não tive por escolha e mais uns minutos de conversa, Débora perguntou-me se eu gostaria de escrever para o blog e partilhar minha experiência.
E aqui estou eu, aos 44 anos, dizendo mais publicamente impossível que já aos 20 e poucos anos, diria que aos 25, com três anos de casada, percebi que filhos não seriam para mim. E olhe que me casei sonhando com 3 lindas crianças ao redor de uma mesa na hora do almoço, com aquela algazarra toda. Sim, já sonhei em ter filhos, afinal, sou filha única e queria viver uma história diferente.
Meu casamento foi se mostrando pouco sólido para receber uma criança, embora fosse o sonho de meu ex-marido. E eu, que desde os primeiros anos de faculdade já direcionava meus estudos às crianças, sentia que ali, naquela união, não haveria “ninho” para as minhas.
Aos poucos fui me dedicando ao trabalho e à minha carreira. O prazer que sinto nisto tudo é enorme, razão pela qual fui chamada de “workaholic” . E era ali que descobri que queria colocar minha energia.Quando há pelo menos 15 anos passei a dizer que não queria filhos, ouvi muita bobagem e fui “atacada” socialmente, com palavras e acusações diversas, principalmente por pessoas próximas. Parecia que era proibido não querer ter filhos!
E assim, entre tantas razões, meu primeiro casamento acabou. No pós-divórcio descobri o gosto de se ter liberdade e não ter ninguém dependendo de você emocionalmente. Dediquei-me à profissão, fiz mestrado, mas também desfrutava do tempo livre para mim. Ser chamada de egoísta era comum e fui me acostumando sem ficar chateada ou irada.
Em meu segundo casamento, meu ex- companheiro tinha filhos grandes e, após uma conversa séria, eu optei de uma vez por todas em não ter filhos. Eu havia descoberto o universo motociclístico e das corridas de ruas, viajava, divertia-me muito , tinha minha tão sonhada autonomia e ali, se ainda existia alguma brecha para maternidade, ela se foi. E ponto final.
Por muito tempo me incomodou o fato de ter sido tão simples para mim não querer ter filhos, que até eu duvidava de minha segurança. Tenho uma lista de pequenos fatores que podem ter influenciado esta escolha, a começar pelos casos de consanguinidade na família de meu pai que geraram algumas pessoas limítrofes. Mas as razões são minhas mesmo, de ordem pessoal: não sinto vontade de ser mãe, simples assim. E dei uma “trabalhada” nisto em terapia só para me garantir.
Simone de Beauvoir diz que maternidade não é destino e isto me aliviou. Não é porque tenho um útero que sou obrigada a gerar um filho.Interessante é que anos atrás, quando dizia às pessoas que não tinha filhos, ficava um silêncio. Aí as mulheres me perguntavam o porquê e não satisfeitas com minha respostas, sugeriam alternativas para uma criança em minha vida, tipo adoção ou inseminação artificial. Algumas vezes fui obrigada a dizer que aquilo que era equívoco e que eu não queria filhos. E a conversa acabava por ali.
Ouvi muito que ficaria sozinha na velhice ( mas quem garante que os filhos iriam cuidar de mim? Tem tantos que não cuidam de seus pais), ouvi que minha vida seria um vazio, enfim, se estivéssemos na época da inquisição, provavelmente eu teria sido queimada na fogueira, na caça às bruxas. No meu consultório ( fui terapeuta infantil durante 16 anos), alguns pais chegaram a questionar meu trabalho pelo fato de não ter filhos. Felizmente nenhum deles tirou a criança do tratamento depois de minha resposta.
Confesso que a única parte que me pegou um pouco foi a minha mãe. E sabem por que? Sou filha única. Ouvi muito, mas muito mesmo, que era uma injustiça não dar pelo menos um netinho à minha mãe, que é daquelas mulheres adoráveis que fazem tricô, crochê e afins para a sobrinhada toda e para quem mais pedir.
Até que um dia, num passado recente, conversamos abertamente sobre isto e o resultado desta conversa veio há uns meses atrás, quando ela me contou que uma nova amiga sua perguntou se eu não tinha filhos e claro, por que. Minha mãe respondeu que meus “filhos” são outros: o trabalho de psicoterapia que faço, o livro que organizei, a nova área de Psicologia do Dinheiro que estou desbravando. E que ela me vê um pouco à frente de meu tempo, com minhas idéias e ideais.
Alívio total, lágrima nos olhos, “dívida” anulada.
A minha marca ao planeta eu quero deixar de outro jeito, não necessariamente com um filho, que sei pelas pessoas que conheci ao longo da vida , que é a mais profunda experiência amorosa. Mas também há outros tipos de experiências de amor e abro-me para elas e me comprometo a fazer uma vida criativa.
Numa sociedade em que a tradição ainda se revela por detrás da modernidade, temos que aprender a manter nossa coerência e construir novas histórias, a partir de um referencial próprio. Busco sempre novas atividades, detesto rotina e tenho pessoas maravilhosas ao meu lado.
Aprendi que não há uma vida ideal, mas uma vida possível. A minha é esta: possível dentro de meus desejos, valores e princípios, que busco renovar a cada dia, com o amor dedicado a mim mesma e a todos que me cercam, pois cada pessoa gera um tipo de vida, que não necessariamente tem que ser um ser humano vindo de suas entranhas.
Valéria